Mapa do Site Acessibilidade:
Logo Amapá
quarta, 21 de dezembro de 2016 - 17:23h
Família de ex-chefe de gabinete do Governo do Amapá lança livro de memórias
Morto em 2015, aos 93 anos, o escritor/memorialista Elfredo Távora teve participação importante na história do jornalismo e da política amapaense
Por: Da Redação .Colaboradores: Manoel do Vale
Elfredo Távora viveu as histórias contadas em seus livros

Acontece nesta quarta-feira, 21, o lançamento, in memoriam, do segundo livro do escritor Elfredo Távora: O Amapá d’Outrora. O evento acontecerá na livraria Public, no shopping Villa Nova, centro de Macapá, sob comando da esposa, Maria Darcy, acompanhada dos seis filhos do casal.

Coragem

No tempo em que o governador Janary Nunes mandava marcar com cruzes as portas das casas de seus opositores, Elfredo Félix Távora Gonçalves, afinava sua verve jornalista na luta pela liberdade de expressão. Junto com alguns corajosos amigos, ele fundou, em 1959, O Combate, cuja existência não passou da quarta edição, dando lugar, no mesmo ano, ao jornal A Folha do Povo, que resistiu até 1964 como espaço de expressão da oposição e dos intelectuais que sonhavam com um Amapá democrático e de oportunidades para todos.

Estrangeiro

Nascido em Belém do Pará em 1922, Elfredo passou grande parte da vida em Portugal, onde fez o curso de Letras no conceituado Liceu Funchal. Mesmo tendo passado praticamente a vida toda naquele país - para onde foi levado pela mãe com pouco mais de 10 meses, após o falecimento do pai -, Elfredo não conseguiu vencer a barreira do xenofobismo português.

Para sobreviver e garantir os estudos dos seis filhos, dona Hildebranda, teve que vender alguns bens que o marido possuía na Ilha da Madeira.

Os seringais do Amapá e a II Guerra Mundial

Além dos imóveis na Ilha da Madeira, o pai, George Mayer, possuía ainda uma casa no município de Amapá e um seringal no médio Araguari, para onde Elfredo mudou, fugindo do desemprego em Portugal, e embalado pela cotação da borracha, em alta por causa da II Guerra Mundial.

Quando chegou a notícia da criação do Território Federal do Amapá, Elfredo Távora vivia o que pensara ser a grande aventura de sua vida: tornar lucrativa a herança deixada por seu pai nas florestas do Amapá.

O financiamento para a empreitada veio do banco da borracha, instituição criada em parceria entre o governo brasileiro e dos Estados Unidos, que além do dinheiro forneceu uma tropa com 32 soldados da borracha convocados no Nordeste do país.

“Logo no início começaram os aperreios. Os homens contratados eram ‘bravos’, isto é, não entendiam nada do trabalho. Reclamavam das condições do isolamento dos abarracamentos, tudo muito diferente do que mostrava a propaganda exibida nos cinemas de Fortaleza ...”, narra o escritor em seu livro Folhas soltas do meu alfarrábio, lançado em 2010.

Contribuíram para piorar a situação de desconforto e prejuízo do aventureiro seringalista, as baixas sofridas pela tropa em razão da malária, que, em menos de um mês, havia abatido mais da metade dos homens.

Quando acabou da guerra, a borracha deixou de ser importante aos Estados Unidos, e a aventura resultou em prejuízo, com o confisco das terras pelo banco. Mas isso não arrefeceu em nada o ânimo de Elfredo, que já se lançava à uma outra, bem mais desafiadora: o desenvolvimento socioeconômico e político do recém-criado território do Amapá, do qual foi testemunha ocular e também ator, nos bastidores.

Homem de letras que era, Elfredo ganhou a simpatia do governador Janary Nunes quando lhe presenteou o livro O verdadeiro Eldorado, a única obra escrita sobre o Amapá até aquela época. O livro, escrito em 1932, por Alfredo Gonçalves, tio de Elfredo, lhe abriu as portas da residência do governo.

Em seu livro, Folhas soltas de meu alfarrábio, o memorialista fala de um pedido feito pelo governador: “... convidado para jantar em sua residência, ele me pediu que se tivesse notícia de irregularidades de seus auxiliares o avisasse, porque ‘nem sempre o governo tem conhecimento do que se passa’, disse ele”.

Mas, onde tudo eram flores no começo, brotaram espinhos com o passar dos tempos e o consequente apego ao poder que fizeram com que o capitão/governador começasse sua caça às bruxas, no caso, aos opositores a seu governo, entre os quais estava Elfredo.

Com o fim da ditadura de Vargas e a convocação das eleições, Janary percebeu que já não era unanimidade, pois apesar da vitória tranquila nas urnas, já eram expressivos os votos nos opositores. O capitão identificou cada um daqueles votos e começou a persegui-los. Mas a resistência já havia plantado sua semente e a derrota de Janary era questão de tempo, pois o partido e os candidatos para isso já existiam.

“Mais difícil que subir em tucumanzeiro”

Foi o que disse Elfredo quando fora pedir a mão daquela com quem iria viver dois terços de sua longa vida.

Maria Darcy Colares, filha de fazendeiro. Esse o nome e a posição social da moça que, aos quinze anos, iria fisgar para toda vida o coração do memorialista, com o qual teve cinco filhos e uma filha.

Sentada na poltrona do escritório onde Elfredo alimentava seus pensamentos, dona Darcy relembra com carinho do seringalista, cujas terras foram compradas de volta do banco e que hoje é uma reserva ambiental particular. A luta pela liberdade de expressão é o aspecto da vida do marido ao qual ela dá mais ênfase.

“Ele participou do governo do Janary, mas ele tinha opinião própria”, comenta sobre a personalidade do marido. “E foi perseguido. Saiu daqui fugido uma das vezes, porque o Janary mandava deportar, mandava fazer qualquer coisa com quem fosse contra ele”, revela Dona Darcy acrescentando que, para vencer Janary, Elfredo, mais alguns amigos, fundaram um partido e se lançaram a batalha no campo das eleições, lutando contra as manobras do governador para se manter no poder. “Até que um dia conseguiram vencê-lo”, festeja a mulher que durante muito tempo após a morte do marido, hesitou em trazer a público o mais recente trabalho do companheiro com quem viveu 60 anos.

O Amapá d’Outrora mantém um pouco do traço memorialista do Folhas soltas do meu alfarrábio, livro que o autor escreveu para os filhos, mas também traz denúncias, curiosidades, apontamentos sobre a história, população, riquezas e curiosidades. É uma narrativa divertida e bastante ilustrativa desse Amapá ainda novo e tão cheio de histórias.

Vale a pena ler e é uma excelente opção de presente de Natal.

GOVERNO DO ESTADO DO AMAPÁ
Site desenvolvido e hospedado pelo PRODAP - Centro de Gestão da Tecnologia da Informação
2015 - Licença Creative Commons 3.0 International
Amapá